Percurso de cadetes a seniores não é fácil mas entusiasma

SELECÇÕES EM FORMAÇÃO


A prática desportiva e a formação recebida nas selecções nacionais e nos clubes complementam-se e contribuem decisivamente para a consolidação da própria personalidade do atleta adolescente no caminho para a sua maturidade...
Contudo, a realidade vivida nas selecções nacionais é peculiar no processo e método de trabalhar a Formação e os jovens que por aí passam fazem-no por gosto, pois não têm vida fácil, até porque os estágios e as competições reduzem ainda mais o pouco tempo livre ao longo da época desportiva e mesmo para além dela.
Quem melhor poderia falar do trabalho que se realiza, a nível da Formação, do que os próprios artífices e protagonistas do mesmo, os atletas cadetes e juniores e os seleccionadores nacionais?
 


A «Manchete» convocou uns e outros e realizou uma reportagem especial:

Comecemos pelos seleccionadores...

Seleccionador Nacional dos Seniores Masculinos, Hugo Silva, treinador com títulos nacionais ao serviço de clubes.
 

HUGO SILVA: “Penso que é do conhecimento de todos que o trabalho que se faz nas Selecções Nacionais de Voleibol é um trabalho muito cuidadoso, pois há tempo para planear os treinos, pensar nos jogos e nos jogadores individualmente.
Contrariamente ao clube, onde basicamente os treinadores vão ao fim do dia, pois têm os seus afazeres profissionais, aqui todos estão concentrados a cem por cento e de facto há um aproveitamento máximo de cada um dos jogadores. E, como é óbvio, quando se trabalha numa selecção pensa-se sempre que estamos a trabalhar na melhor qualidade possível e isso é extensivo a todas as selecções, dos cadetes aos seniores, quer masculinos quer femininos”.


Nos juniores, o atleta está no limiar, está quase a dar o passo que o fará entrar nos seniores. Isso pesará na sua própria postura enquanto jogador?


HS: “Sim, porque é a fase em que eles têm de se questionar se querem dar o passo em frente e ir para outro patamar, quem sabe, de profissionalismo em Portugal ou no estrangeiro e é, de facto, uma fase decisiva para alguns dos jogadores. Outros poderão continuar a pensar na competição, mas com a consciência de que chegar ao nível mais alto será mais difícil a partir do momento em que se tornarem seniores.
A minha presença na Selecção Nacional de Juniores Masculinos [preparação e disputa da Poule de Qualificação para o Mundial 2015] visava essencialmente um eventual transfer de um ou outro jogador para a selecção sénior – não podemos esquecer que estamos ainda num processo de renovação da nossa selecção principal – e, de alguma forma, dar a oportunidade a dois ou três jogadores juniores de fazerem parte dos próximos trabalhos da Selecção de Seniores já no Verão.
Esse foi o grande objectivo e penso que podemos ficar optimistas em relação a isso porque há dois ou três juniores que podem certamente ajudar a nossa selecção principal”.
 


Que características um seleccionador/treinador gosta de ver num atleta?

HS: “Eu gosto de ver aquele atleta que sua no treino, que dá tudo, independentemente das suas limitações. Dá-me gozo ver os atletas que, independentemente das suas condições, fazem tudo para ajudar o grupo de trabalho e também para crescerem como jogadores.
Esses são, de facto, uma mais-valia.
Depois, sou um apaixonado de um ou outro gesto técnico, sobretudo do bloco, o que implica jogadores altos. É um entusiasmo muito grande poder dispor de atletas altos para trabalhar aquilo em que mais acredito, mas, acima de tudo, a raça, o querer do atleta é meio caminho andado para se conseguir ter sucesso”.


Em que é que os atletas portugueses, sobretudo os jovens, podem fazer a diferença?


HS: “Sabemos que comparativamente às outras selecções, somos muito mais baixos. Nós podemos e fazemos a diferença pela velocidade do jogo que podemos imprimir e pela habilidade técnica que temos. Creio que somos dos melhores do mundo em termos técnicos, embora obviamente a altura constitua uma lacuna muito grande.
Se compensarmos com a questão da velocidade e usarmos o recurso técnico nessas mesmas situações, dá para equilibrar as forças, como temos vindo a fazer e a equipa sénior é o espelho disso”.


 


 António Guerra: “Os clubes têm sido extraordinários”



António Guerra
, Seleccionador Nacional dos Juniores e dos Cadetes Masculinos, destaca o papel importante desempenhado pelos clubes como alicerces do trabalho nas Selecções:
 

ANTÓNIO GUERRA: “Conseguimos articular muito bem o nosso trabalho com o dos clubes, que têm sido extraordinários. Temos tido uma abertura máxima por parte dos treinadores, para competir, para treinar, para disponibilizar os jogadores da I Divisão, o que é sempre complicado. E os jogadores também estão a retribuir, pois começamos a ter já vários jogadores com idade de cadetes a jogar nas equipas seniores dos clubes.
Todo o trabalho que fazemos nas selecções mais jovens é realizado com o objectivo de esses jogadores atingirem a Selecção Nacional de Seniores e o mais rapidamente possível. Como é que colocamos nas selecções jogadores disponíveis, que saibam treinar, que saibam estar e que sejam agressivos a competir? Sempre que temos possibilidades, fazemos com que esses jogadores tenham mais treinos e tempo de competição para chegarem a seniores já bem preparados.
Numa primeira fase é natural que esses jovens tenham mais uma função de ajudar os seniores no processo de treino, mas devem ter sempre em mente o objectivo de virem a ser jogadores dos seniores”.


Nesse percurso, quais são os aspectos principais para o treinador?


AG: “Há dois aspectos que são muito importantes: o primeiro é, naturalmente, que eles consigam conciliar a sua vida académica e social com o trabalho na Selecção; o segundo é que se orientem para serem jogadores de um determinado nível, que estejam motivados para vingarem na modalidade. Conciliar a vida escolar é muito importante e querer mesmo ser jogador e organizar a sua vida para poder jogar são os dois aspectos cruciais na fase inicial.
Reunindo esses dois aspectos, o grupo torna-se homogéneo no querer e nas vontades.
A partir daí é treinar, com orientação, com objectivos, sempre com uma perspectiva a longo prazo de virem a ser jogadores da Primeira Divisão e da Selecção Nacional”.


É complicado implantar uma rotina no dia a dia do grupo de trabalho?


AG: “No caso dos Cadetes, e como temos jogadores que trabalham com a Selecção há quase três anos, isto é já fluído. Eles também beneficiaram muito do facto de terem trabalhado com a Selecção de Juniores, pois muitos dos valores e princípios que esta selecção tinha passaram, com naturalidade, para os mais novos. O processo torna-se muito mais rápido. Eles já entram numa máquina bem oleada, o que torna tudo muito mais fácil e o dia-a-dia é muito tranquilo pois esta Selecção está muito organizada e a gestão já é toda feita praticamente pelos jogadores. Nós definimos chefes de dia, chefes de treino, calendários, afixamos nas portas as directrizes e os atletas assimilam isso de uma forma natural e fluida”.





Como é que se pode caracterizar esta Selecção de Cadetes?


AG: “Neste momento, é um grupo homogéneo, em todos os aspectos. Tem mais soluções, com mais jogadores que podemos pôr a jogar. É um grupo equilibrado, que começa a apresentar um Voleibol mais evoluído e a ser competitivo, agressivo, um grupo que quer ganhar e está motivado para atingir os seus objectivos.
A vitória no Torneio Navidad ajudou porque disse que nós evoluímos dentro da WEVZA. Nós tínhamos perdido 0-3 com a França, 1-3 com a Espanha e o torneio disse que nós evoluímos e que estávamos melhores do que os outros e que, neste momento, na WEVZA, na parte oeste da Europa, podemos considerar que estamos entre as quatro melhores equipas.
Isto para nós foi muito importante porque é sinal de que estamos a seguir o rumo certo. Estamos a aproximar-nos cada vez mais das equipas de topo da Europa.
Pensamos que dentro de um ano ou dois poderemos vir a ter uma Selecção que poderá estar de igual para igual em termos de estatura com as selecções de nível internacional. Temos vindo a introduzir nos cadetes jogadores cada vez altos e penso que esta poderá vir a ser a primeira Selecção de Juniores verdadeiramente alta e compacta”.


 


 Paula Semedo: “Incutimos garra e um espírito de lutadoras”



Paula Semedo
, Treinadora Adjunta, traça um quadro daquilo que espera as jovens lusitanas que dão entrada no grupo de trabalho das selecções mais jovens.
 

PAULA SEMEDO: “Somos muito duras no treino, mas há sempre um enorme convívio e amizade a par do trabalho que realizamos.
A verdade é que é muito recompensador treinar meninas que têm grande vontade de aprender, muito aplicadas e que se entregam completamente aos treinos. Treinam sempre com a mesma intensidade durante duas horas e meia, por isso há que dar o devido valor a estas miúdas, que abdicam desta idade maravilhosa da juventude para treinar diariamente com o intuito de se tornarem jogadoras cada vez melhores.
Agora, temos também de lhes incutir garra e um espírito de lutadoras, que falta um bocadinho nestas idades, o querer fazer sempre melhor e lutar sempre pelos pontos. Com a minha experiência como jogadora e guerreira que fui, tento transmiti-lhes isso e aproveito ainda alguns bocadinhos que posso para jogar no meio delas... para verem que o ponto só se perde quando a bola cai no chão!”


Esta geração de jovens terá outro tipo de ambições?


PS: “A vontade de querer, a luta constante e aguerrida que promovemos nos treinos são mais-valias em qualquer altura da nossa vida profissional e pessoal.
Nestas idades ainda há muito o espírito de não quererem assumir a iniciativa para não falharem e é isso que tentamos contrariar ao trabalharmos na formação.
Também querermos que sejam mais comunicativas e que assumam os seus erros e que os corrijam por si próprias, o que as ajudará até a enfrentar desafios na sua vida privada.
Não temos razões de queixa destas jogadoras que trabalham connosco, pois sacrificam-se imenso e prescindem de algumas coisas da sua juventude, abdicando de passar mais tempo com a família, de irem ao cinema com os amigos, etc.. Levantam-se às cinco da manhã e começam a treinar às seis.
É por isso que lhes dizermos para se libertarem do exterior e estarem nos estágios de corpo e mente e aproveitarem ao máximo, pois os sacrifícios que fazem têm de valer a pena.
É isso que temos de fazer na formação: muito volume, muita insistência: “errou o ataque, torna a atacar”.
Sublinho: dá-me um gozo imenso trabalhar com estas meninas pois elas são realmente muito aplicadas.
Isto funciona como uma segunda família e, no meu caso, até passo mais tempo com elas do que com a minha própria família. Por isso, tenho um carinho especial por todas e custa-me imenso saber nos momentos em que temos de divulgar a convocatória que algumas ficarão de fora por não podermos levá-las a todas para a competição”.


A estreia internacional é um momento complicado para uma jovem atleta...


PS: “O Torneio de Navidad, que disputámos em Espanha, serviu, sobretudo, para retirar um pouco da pressão da estreia internacional. Para muitas das miúdas, essa foi a primeira vez que representaram a selecção, pelo que sentiram muita ansiedade e muito o peso de jogarem sob a bandeira do seu país. Estes torneios servem para elas perderem essa ansiedade, soltarem-se mais e libertarem-se dos seus receios, pois só assim conseguirão concentrar-se totalmente no jogo... Elas treinam muito bem, mas, depois, não conseguem pôr em prática, de forma perfeita, nos jogos o que trabalharam durante os estágios.
Na Poule de Qualificação para o Europeu, já entraram em campo com outra atitude e isso notou-se nas exibições e nos resultados [duas vitórias em três jogos]”.




 

E os jovens? O que é que pensam do trabalho que realizam, por vezes diariamente, nas Selecções Nacionais? Quais as suas ambições como praticantes de Voleibol? Procurámos exemplos diversos, quer pela ascendência, situação geográfica ou mera forma de pensar...


 


  João Oliveira: “A Selecção não deve 
  ser encarada como um hobby” 



João Oliveira, jogador que representa as selecções de juniores e de seniores e a equipa principal do SL Benfica, actual campeão nacional, é um dos melhores exemplos de abnegação na juventude [a embriaguez sem vinho, como lhe chamou Goethe] em beneficio da evolução como jogador... Embora por vezes as adversidades façam a sua aparição sob a forma de lesões em momentos que se tornam ainda mais dolorosos psicológica do que fisicamente.


JOÃO OLIVEIRA:
“Acho que cada atleta tem os seus objectivos pessoais. O meu é representar a Selecção. Esta Selecção de Juniores é boa, gosta de trabalhar e é muito unida e este ano eu ainda tinha a possibilidade de voltar a representá-la [Poule de Qualificação para o Mundial de Sub-21], e fazia-o com todo o prazer, mas... lesionei-me mais uma vez.
Infelizmente, já falhei muitas competições por causa de lesões e sinto sempre uma frustração enorme. Não há muito a dizer nem palavras para descrever isso, pois num segundo mudou o panorama todo.
Estava a trabalhar normalmente, como todos os meus colegas, e calhou-me a mim lesionar-me com alguma gravidade. É uma tristeza, mas não me deixo abater. Vou trabalhar para poder representar os seniores, que é o patamar mais alto que um atleta pode almejar”.


O que sentes, quando representas a Selecção Nacional?

JO:
“É sempre uma honra para qualquer atleta representar a selecção do seu país, seja qual for o escalão, e todos devemos responder a essa confiança que depositam em nós com muito trabalho para podermos dignificar Portugal.
Há sempre pressão quando jogamos a nível internacional, mas acho que a alegria de representar o País e de jogar Voleibol, que é uma paixão, supera isso.
Quem me conhece desde miúdo, como a minha família e os meus amigos mais próximos, sabe como encaro os desafios. Tanto na Selecção como no clube, tento estar física e psicologicamente bem preparado e sempre a um nível muito alto para poder dar uma resposta cabal ao que for solicitado.
Não escondo o desejo de poder vir a jogar em ligas mais fortes, mas, neste momento, os meus únicos objectivos são trabalhar afincadamente em prol dos objectivos do grupo e da equipa em que estou integrado”.


Vale a pena sacrificar alguns aspectos da tua juventude?

JO:
“Não creio que haja aspectos negativos nos estágios da Selecção, pese embora o facto de por vezes ficarmos afastados das famílias durante um largo período de tempo.
Devemos estar contentes e agradecidos por ganharmos muita experiência e aproveitarmos os conhecimentos dos profissionais que trabalham connosco todos os dias e que estão a um nível muito alto no seu trabalho.
A nossa resposta àquilo que nos dão terá de ser feita com muito trabalho e com uma postura séria. O facto de integrarmos a Selecção não deve ser encarado como um hobby mas sim um trabalho a sério em que temos de mostrar todos os dias o que cada um vale”.

 


  Filip Cveticanin: “O tempo que aqui passamos 
  é do melhor da nossa vida” 



Filho de um jogador de Andebol sérvio, Filip Cveticanin, de 1,98 metros de altura, é um potencial candidato a um lugar no grupo de trabalho da Selecção Nacional de Seniores Masculinos.
O jovem central do Castelo da Maia GC recorda a primeira chamada à Selecção Nacional.


FILIP CVETICANIN:
“Não foi muito fácil chegar até aqui. Eu comecei a jogar Voleibol há apenas cinco anos, e nunca esperei que ao fim de uma época fosse chamado à Selecção de Cadetes, orientada na altura pelo professor Jose Antonio Rojas.
Ele disse-me que gostou muito de mim e que depois me chamariam outra vez. Passado alguns meses, assim aconteceu e comecei a treinar todos os dias e uma vez por semana ia ao clube, que, na altura, era o Gueifães”.


Como é que te sentiste, quando foste convocado pela primeira vez para os trabalhos da Selecção?

FC:
“Senti-me muito bem, embora tenha de confessar que não esperava ser chamado para o primeiro estágio dos Cadetes e muito menos depois ser convocado para a minha primeira competição internacional.
Senti-me espantado mas ao mesmo tempo muito contente por concretizar aquilo que para mim não passava de um sonho, pois achava que havia jogadores melhores do que eu. Era muito novo, não tinha grande experiência e a chamada surpreendeu-me. Depois dessa poule, logo no mesmo ano fui chamado para a Selecção de Juniores. E no meu quarto ano de Voleibol, o Castelo da Maia convidou-me para jogar nos juniores e seniores e fui evoluindo cada vez mais e aqui estou”.


E agora, que és já um habitué das selecções nacionais?

FC:
“Ainda estou numa certa expectativa a ver como me saio, mas, se as coisas correrem bem, gostaria de seguir uma carreira no Voleibol.
Por enquanto, creio que me estou a sair bem, mas o meu objectivo é melhorar cada vez mais. Os sacrifícios que fazemos valem a pena, pois podemos dizer que o tempo que passamos aqui é do melhor da nossa vida.
Sentimos isso na nossa evolução e temos sempre de pensar que o trabalho que realizamos vai dar os seus frutos no futuro. Estou no 12.º ano e a escola vem sempre em primeiro lugar, depois... logo se vê”.


 


  Julia Kavalenka: “Só quem gosta muito 
  é que passa por isto” 



Julia Kavalenka, de ascendência russa, é a capitã de equipa e a jogadora mais alta (1,91 metros) da Selecção Nacional de Cadetes Femininos, bem como atacante no GDC Gueifães.
Apesar de ter alcançado os seus objectivos, que era atingir o 2.º lugar e assim alimentar aspirações sobre a qualificação, a Selecção Nacional não conseguiu, por infelicidade [ficou a apenas um set], carimbar o almejado passaporte para a fase final do Europeu de Cadetes.


JULIA KAVALENKA:
“Creio que em apenas quatro meses evoluímos bastante. Temos uma atitude muito boa dentro do campo. Já estive na Selecção de Juniores e acho que esta Selecção de Cadetes é ainda mais unida; há um grande espírito de entreajuda, puxam todas umas pelas outras.
É sempre um orgulho vestirmos a camisola da Selecção Nacional e disputarmos qualquer competição em representação do nosso País, pois sentimos sempre uma vontade enorme de dignificar Portugal, mesmo que os resultados nem sempre sejam aqueles que desejamos”.


É essa a mensagem que tentas transmitir, enquanto jogadora mais experiente, pese embora a tua juventude (15 anos)?

JK:
“Tento transmitir, sobretudo, aquilo que já senti lá fora em representação da Selecção. É normal que sintam receio e que fiquem ansiosas devido à pressão de jogarem numa selecção e, eventualmente, de fazerem até a sua estreia.
Todas nós sentimos isso e as jogadoras das outras selecções não constituem excepção, pois são como nós, independentemente de serem melhores tecnicamente, devido ao facto de treinarem todas juntas e de algumas jogarem já nas seniores dos respectivos países”.


Como é o dia-a-dia nos estágios?

JK:
“Num estágio permanente, acordamos cedo [no caso das Cadetes, às 5h00] e treinamos logo de seguida; de tarde, voltamos a treinar. Sentimo-nos mais cansadas do que quando temos aulas, pois nesse período conseguimos descansar mais.
Abdicamos das férias para aumentar o volume de treino e podermos preparar-nos melhor para representar o país. Só quem gosta muito do que está a fazer é que passa por isto.
Se formos a ver, talvez estejamos a atravessar a melhor idade do ser humano, em que há tanto para descobrir, e nós estamos a abdicar um pouco dela, mas ao serviço da Selecção fazemos amizades sólidas e aprendemos coisas que se não estivéssemos aqui provavelmente não conseguiríamos”.


 


  Victória Ribeiro: “O nosso trabalho 
  tem de ser intenso” 



Victória Ribeiro é filha de Karen Ribeiro, ex-jogadora de Voleibol, modelo a apresentadora de televisão, e de Fábio Jardel, jogador brasileiro que se notabilizou ao serviço da equipa de futebol do FC Porto e que, quando jovem, praticou Voleibol.


Ias passar férias ao Brasil, que é o sonho de qualquer adolescente, principalmente numa época do ano tão fria em Portugal, e optaste por treinar com a Selecção Nacional. Porquê?

VICTÓRIA RIBEIRO:
“Jogo Voleibol há já nove anos, o que diz um pouco do muito que eu gosto da modalidade. Integrei outro estágio, no Verão, onde aprendi muito e comecei a alimentar esperanças de ser convocada para disputar a fase de qualificação para o Europeu, o que veio a acontecer, pelo que nem pensei duas vezes onde iria passar as minhas férias de Natal”...


Como foi a adaptação ao grupo de trabalho?

VR:
“Sou de Lisboa, enquanto a maioria das outras jogadoras são do Norte do país, mas fizemos logo amizade e formámos rapidamente um grupo muito unido.
O facto de ter já antecedentes familiares no desporto ajuda-me, pois o simples facto de assistir a vídeos dos jogos disputados pelo meu pai e pelo meu padrasto (o hoquista Filipe Gaidão), sobretudo pela forma como se entregavam à competição, dá-me mais força. O meu padrasto foi, inclusive, ver os jogos que disputámos em Schaffhausen, na Suíça [Torneio da WEVZA de Sub-17].


Portugal defrontou já algumas das melhores selecções europeias. Que antídoto pode apresentar contra o poderio das suas jogadoras?

VR:
“Tendo em conta que nas competições defrontamos sempre equipas com jogadoras muito altas e fortes em praticamente todas as situações de jogo, o nosso trabalho tem de ser intenso para conseguirmos estar ao nível delas.
No Torneio Navidad [em Sória, Dezembro de 2014], não estivemos muito bem e regressámos de Espanha com uma enorme vontade de trabalhar e de corrigir alguns aspectos do nosso jogo, sobretudo a recepção, o bloco e a defesa baixa. Algumas, como nunca tinham ido a nenhuma competição internacional, ao verem o pavilhão com tantas pessoas ficaram logo muito nervosas”.


Ambições pessoais?

VR:
“Gostaria de conseguir fazer carreira no Voleibol, de ir viver e estudar para o Brasil e jogar lá profissionalmente.
O nível do Voleibol brasileiro é muito elevado, como se pode ver nos jogos quer das selecções quer dos clubes brasileiros, e exige muito das jogadoras, que treinam intensamente todos os dias, e eu gostaria de ser como elas e de um dia poder vir a estar no seu lugar”.


 


  André Rosa: “Vencer o Torneio Navidad 
  uniu ainda mais a equipa” 



André Rosa é o capitão de equipa dos Cadetes Masculinos e central do Esmoriz GC.


Nasceste na Madeira e vieste há pouco tempo para o continente. A mudança foi pacífica ou... drástica?

ANDRÉ ROSA:
“É sempre diferente, porque deixamos lá os pais, a família, os amigos, mas acho que foi uma decisão correcta porque vim para cá para melhorar naquilo que gosto mais de fazer, que é jogar Voleibol, e até agora estou a adorar e não tenho nada de que me arrepender. É verdade que temos sempre de fazer alguns sacrifícios, mas o nosso pensamento deve ser o mais positivo possível, para seguirmos em frente. Segui um percurso que pode ser considerado normal: comecei nas escolinhas, no desporto escolar, gostei muito do Voleibol, quis ir para um clube, fui para o CS Marítimo e, mais recentemente, ingressei no Esmoriz GC. Confesso que fui apanhado de surpresa com a chamada à Selecção Nacional, pois havia vários jogadores bons, mas integrei-me bem no grupo de trabalho”.


Integraste as selecções de cadetes e de juniores, os seniores estão já no teu horizonte?

AR:
“Já estive nos juniores, que é como que uma fase de transição para os seniores, uma fase muito importante, mas considero que o que há a fazer é continuar a lutar.
Os jogadores desta Selecção de Cadetes serão todos juniores no próximo ano. Logo se verá quem continua até aos seniores, mas é claro que esse deve ser sempre o objectivo de qualquer jogador que integre uma selecção jovem, pois significa o ponto mais alto do nosso trabalho”.


E ser capitão de equipa?

AR:
“Não me considero diferente dos outros. Damo-nos todos muito bem, somos todos muito parecidos na forma de estar. É mais o título e ter a oportunidade de falar com o árbitro durante o jogo, porque de resto somos todos iguais e lutámos todos pelos mesmos objectivos.
Este grupo de trabalho é muito bom. Somos muito aguerridos, lutamos sempre pelos nossos objectivos e queremos mostrar resultados. E estávamos confiantes que eles aparecessem já nesta poule, pois este grupo queria muito apurar-se para o Europeu...”.


A Selecção Nacional de Cadetes Masculinos ergueu, em Palência, o troféu de vencedor do Torneo Internacional de Navidad 2014.

AR:
“Portámo-nos muito bem. Deu para mostrar um pouco melhor o que realmente valemos e, naturalmente, deu-nos ainda ânimo para trabalharmos, pois os resultados que aparecem também são frutos do trabalho que desenvolvemos.
De facto, foi muito bom. Conseguir uma vitória num torneio para Portugal, uniu ainda mais esta equipa, deu-nos outro moral”.


 


  Miguel Agapito: “Gostaria de construir 
  uma carreira ao nível mais alto” 



Miguel Agapito, libero dos seniores do SC Caldas, foi chamado pela primeira vez à Selecção Nacional.


MIGUEL AGAPITO:
“É um sinal de que estou a trabalhar bem. Tem sido uma experiência nova e estou a gostar muito de estar aqui, pois o grupo é porreiro. A minha ideia é trabalhar cada vez mais para ver se continuo a ter lugar nos jogadores convocados para os trabalhos das selecções.
Não é fácil chegar a uma Selecção Nacional. Um atleta tem de dar o seu melhor, esforçar-se ao máximo e, acima de tudo, treinar e tentar superar-se todos os dias”.


Foste como que lançado às feras...

MA:
“Sou cadete e estou a jogar nos seniores. Não vou dizer que fui lançado às feras, mas é um nível diferente, no qual lido com jogadores com outra experiência, com um ritmo de jogo muito mais acelerado e complicado, mas estou sempre preparado para dar o meu melhor.
Esta Selecção tem um ritmo parecido com aquele a que jogo no meu clube e fiz tudo para ir à Poule de Qualificação para o Europeu; não fui convocado, mas estou contente na mesma pois vim para este grupo de trabalho para ajudar a Selecção e acho que consegui.
Esta Selecção merece o melhor possível, pois esforça-se ao máximo em tudo o que faz”.


E como é defrontar alguns dos teus ídolos?

MA:
“É verdade, já defrontei jogadores que significam muito para mim, como o Ivo Casas [libero] e o Hugo Gaspar [oposto], do SL Benfica, o Gaspar porque nos juniores do SC Caldas eu não jogo a libero mas sim a zona 4.
Treino quatro vezes por semana nos seniores e uma vez por semana nos juniores e ao fim-de-semana jogo pelos seniores e depois pelos juniores.
Dá-me mais gozo estar nos seniores, até porque é a I Divisão Nacional e gostaria de um dia poder construir uma carreira ao nível mais alto”.


 


  André Lázaro: “Apoio dos espectadores 
  é como um sétimo jogador” 



O distribuidor André Lázaro, do Leixões SC, é sobejamente conhecido dos seguidores da modalidade, não só pelo trabalho que desenvolve como jogador e que o levou à Selecção Nacional, mas igualmente, ou sobretudo, pela forma entusiástica e contagiante como apoia, tanto no Indoor como no Voleibol de Praia, os representantes portugueses nas competições internacionais.


O que é que te leva a vibrar tanto com o Voleibol?

ANDRÉ LÁZARO:
“Tive sempre uma grande paixão pelo Voleibol, um desporto que eu adoro. Os meus pais incentivaram-se sempre a fazer desporto e pratiquei várias modalidades, já estive no Futebol e no Basquetebol, mas o Voleibol foi sempre o que mais me entusiasmou.
Gosto de ir aos recintos dos jogos para apoiar quem joga, pois sei o quão importante isso é para um atleta, pois se fosse eu que estivesse a jogar também gostaria de ser incentivado pelos espectadores”.


E quando és tu que estás a jogar?

AL:
“Quando estou em campo também procuro solicitar o apoio de todos, pois tudo fica mais fácil se sentirmos que somos apoiados. É como se entrasse em campo um sétimo jogador e esse apoio é sempre gratificante.
Creio que os jogadores reagem de forma positiva a esse apoio que lhes é dispensado, jogando com mais confiança. Ao invés, os adversários ficam com o moral um bocadinho pior, pois sentem que nós temos os adeptos do nosso lado e começamos a jogar cada vez melhor. Dentro de campo temos muito mais adrenalina e é muito melhor jogarmos assim”.


Como definirias o teu grupo de trabalho na Selecção?

AL:
“Este grupo está muito bem formado. Penso que é uma equipa compacta e creio que a maneira como está a desenvolver o seu trabalho e a jogar é motivo de orgulho para todos os portugueses”.



 

  TESTEMUNHOS 


 


  Núria Lopes da Silva: “Sem os treinos 
  nas selecções, nunca teria chegado onde cheguei” 



Apesar de a sua data de nascimento (26 de Dezembro de 1991) a remeter para as seniores, Núria Lopes da Silva, actualmente a jogar na Hofstra University, universidade norte-americana onde está a tirar o curso de Relações Públicas, depois de ter representado o Múrcia na Superliga Espanhola, ficou ligada como que umbilicalmente às selecções mais jovens. A ligação é tão forte que a jogadora/estudante integrou os treinos das cadetes, ajudando a equipa técnica a incutir mais garra às suas pupilas.


NÚRIA LOPES:
“Mantive sempre o contacto com a Professora Gilda, que é a minha mentora. Mesmo estando no estrangeiro, continuo a telefonar-lhe a pedir conselhos, pois ainda sou muito nova e o mundo lá fora é muito grande. Com a experiência que tem, mesmo a nível de outros países, ela vai-me aconselhando e fala-me sempre das raparigas e dos treinos das selecções e eu disse-lhe que quando entrasse de férias poderia vir e treinar um pouco e incutir-lhes motivação.
Elas precisam de alguém que as motive e lhes faça ver que podem fazer sempre algo mais”.


Apesar de teres apenas 23 anos, estás já a correr mundo...

NL:
“É verdade que os últimos anos foram um pouco loucos. Estive a estudar em Múrcia e joguei lá dois anos na Superliga [a divisão principal em Espanha], estive nos Estados Unidos e joguei igualmente dois anos na Primeira Liga.
Nunca imaginei, em quatro anos, estar em dois locais completamente diferentes e... eu adoro a experiência que estou a viver.
Estar em Nova Iorque foi o realizar de um sonho que vinha já de criança e poder estudar lá e simultaneamente jogar Voleibol no campeonato principal é mesmo, como dizem lá, «the best of the both worlds»!
Mas também tenho saudades de muita coisa, sobretudo da minha família. São dois países muito diferentes... Tenho saudade da comida! E do estilo de vida. Lá é muito stressante, a toda a hora”.


O que atingiste fica também a dever-se ao teu percurso na Selecção Nacional?

NL:
“Quando integrei pela primeira vez os trabalhos da Selecção Nacional, eu «nem sabia caminhar», como dizia a Prof. Gilda. Eu olhava para as outras e sentia sempre alguma insegurança, pois era uma das atletas mais baixas, mas ela motivou-me e disse-me que se eu queria realmente jogar teria de mostrar o meu valor, independentemente das condições físicas. Foi o que eu procurei fazer, treinando sempre de manhã e à tarde e estudando à noite.
Isso ajudou imenso, pois fora do país ninguém me conhecia e eu tive de me esforçar para mostrar o meu valor. Sem os treinos e a preparação física e mental que fiz na formação das selecções, nunca teria chegado onde cheguei.
Diziam “ela é baixinha, não faz nada”, mas a Prof. Gilda ensinou-me a dar uma resposta aos críticos. Valeu a pena treinar todas as manhãs e tardes na Selecção Nacional pois isso permitiu que eu aperfeiçoasse cada acção e movimento. Os trabalhos na Selecção Nacional sempre foram árduos e isso foi bastante importante”.


Vês esse teu espírito reflectido nestas jogadoras?

NL:
“Elas são muito novinhas, mas o espírito está lá, só precisa de sair cá para fora e isso só acontecerá quando elas tiveram mais confiança nelas próprias e, com a ajuda umas das outras, transportarem isso para dentro do campo.
Logo no primeiro treino que fiz com elas, fiquei encantada, pois creio que elas têm espírito e potencial para fazerem muito mais”.


 


  Diogo Barata: “É importante ouvir os atletas 
  quando se sentem mais em baixo” 



A vida dos atletas é feita de alegrias, mas também de desilusões. Por vezes, a decepção não tem tanto a ver com o resultado que não se consegue atingir mas mais com o facto de o jogador não se sentir a 100% para dar o seu contributo à equipa.

Diogo Barata, fisioterapeuta das Selecções Jovens, trata da questão das lesões, espectro que paira, por vezes perigosamente, no pensamento de qualquer atleta...


DIOGO BARATA:
“No Voleibol, as lesões mais vulgares são as tendinites ou tendinopatias da coifa dos rotadores, as tendinites do rotuliano ou do quadricipital e, em termos traumáticos, as entorses.
Também por vezes temos lombalgias, cervicalgias, como é normal no desporto”.


Por vezes, o trabalho do fisio é mais psicológico...

DB:
“É muito importante conseguir ouvi-los. Tentar ajudá-los nos momentos em que se sentem mais em baixo. Principalmente durante o processo de reabilitação, que muitas vezes são alturas muito complicadas. Dar um apoio extra e deixá-los desabafar os seus receios e ajudá-los a ver a possibilidade e a perspectiva de ver ali uma melhoria, ajudando-os a atingir os seus objectivos”.


E como é que os atletas reagem a uma lesão?

DB:
“A reacção à lesão depende muito da lesão em si e do próprio atleta. Há atletas que são muito optimistas e com uma perspectiva muito positiva; há outros que se deixam ir um bocado abaixo e que têm uma visão mais negra do seu estado e que estão sempre à espera que a coisa não corra tão bem.
Depende muito do tipo de lesão e da altura em que ela ocorre. Uma lesão que aparece em cima de uma competição, é uma lesão muito complicada para o atleta lidar; numa fase mais calma e com uma lesão menos grave os atletas conseguem reagir melhor e às vezes até aproveitar esse período para melhorar a sua forma física.
A lesão que mais me marcou até agora foi uma fractura de um dedo de um atleta cadete, dias antes de uma convocatória para a Selecção de Juniores que iria contemplar esse atleta. De uma momento para o outro, dois anos e tal de trabalho foram quase por água abaixo e impediram-no de, naquele momento, de integrar uma selecção de um escalão mais alto do que o dele”.


Que cuidados tem um fisioterapeuta de uma Selecção antes e depois de uma competição?

DB:
“O meu trabalho com as Selecções depende muito da continuação dos treinos. Selecções que treinam durante todo o ano permitem-se exercer dois tipos de trabalhos distintos. Por um lado, é feita a reabilitação de lesões derivadas do treino, como é o caso das entorses, tendinopatias ou raquialgias, entre outras. Por outro lado, é possível fazer algum trabalho de prevenção de lesões e até de melhoria da performance. É fundamental referir que este último é sempre um trabalho multidisciplinar em que colaboro de forma próxima com treinadores e atletas.
Quando as Selecções apenas se juntam em estágios, muitas vezes pouco mais dá para fazer do que reabilitar lesões existentes. Entre estágios, tento manter-me disponível caso os atletas necessitem de recorrer aos meus serviços. Contudo, de um modo geral, estes são acompanhados pelas equipas médicas dos respectivos clubes ou até pelo Centro de Medicina Desportiva”.
 


Janeiro 2015
 


 

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